Na “Aldeia Pintada” o mote é homenagear, de forma artística, o património imaterial cultivado pelas suas gentes


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É por entre serras, estradas calcantes e ambientes verdejantes onde se situa a aldeia da Torre da Magueixa, atualmente conhecida apenas como Torre, localizada no Município da Batalha. Recentemente, nasceu nesta localidade um projeto de cariz cultural e social apelidado por Aldeia Pintada, que veio acrescentar ainda mais cor e identidade à aldeia da Torre.

Em paredes estão estampadas memórias de uma vida em forma de dizeres, cânticos e expressões particulares da aldeia da Torre. É nelas que estão gravadas lendas e histórias que passaram de geração em geração. Uma urgência em homenagear o património da Torre deu-se com as novas gentes, que se foram apercebendo da singularidade, essência e riqueza que, na verdade, sempre habitou nesta povoação.

Eva Arrojado, Sandra Pereira, Mariana Menezes, Diogo Monteiro e Filipe Cordeiro dão a cara por esta iniciativa, mas garantem que é de facto um projeto coletivo: “Nós tivemos a ideia mas o objetivo é as pessoas participarem, e se alguém aparecer é sempre bem vindo. E é o que tem acontecido, estamos a fazer qualquer coisa e aparecem pessoas da aldeia, da nossa idade, pessoal conhecido que se vai juntado”, conta-nos Eva.

Foi através de almoços de família e conversas com a velha guarda que as histórias e lendas da Torre sobre criaturas místicas, como bruxas e lobisomens, começaram a suscitar interesse por parte dos mais novos, alimentado a vontade de querer saber sempre mais. Diogo refere que “há histórias e tradições que se calhar até são comuns nas aldeias aqui à volta, mas fomos também percebendo que havia muita coisa mesmo só aqui da Torre.”. A vontade de imortalizar a alma desta aldeia iniciou-se com aquela que foi a primeira intervenção artística deste projeto. Eva assume que inicialmente existiu um receio geral, pois não sabiam como a população local iria reagir, então decidiram fazê-la numa parede exterior da casa de Sandra e Diogo. Neste moral pode ler-se “Fomos à Barrosinha, juntinhos a passear, o tempo arrefeceu, tivemos de voltar”.

Já a segunda intervenção não pôde passar despercebida. Na Estrada da Torre encontra-se um muro branco comprido com referência à cantiga das resineiras: “Elas iam trabalhar e ao final do dia vinham a cantar até chegarem à aldeia, então muitas pessoas ouviam-nas ao longe a cantar e todos diziam “Lá vêm as resineiras”. Ia muita gente às janelas para as ver e era uma festa.”, refere Diogo.  O trecho da cantiga que foi inscrito sobre o muro é, “O lugarinho da torre, tem ladeiras a subir, quem lá vai amar amores, vai ao céu e torna a vir; Eu hei de cercar a Torre, com 30 metros de fita, a porta do meu amor, há-de ser a mais bonita.”

Esta intervenção foi recebida de braços abertos pelos habitantes da Torre, que ajudaram a elaborar todo o mural. “O feedback foi muito positivo porque basicamente toda a gente parou e disse “Muito Bem!” e até nos ofereceram ajuda…”, conta-nos Eva.

Para além destes dois murais, há mais cor espalhada pela aldeia, incluindo na zona da Barrosinha que tem vindo a receber bastantes visitantes devido ao novo baloiço que lá foi construído. Mais para a frente da zona da Serra da Barrosinha encontra-se outro mural, referente à Ilha das Berlengas.

As intervenções artísticas são apenas uma parte daquilo que é a Aldeia Pintada. Tanto a música, como o vídeo e a fotografia formam um todo daquilo que é a pura caracterização da Torre, que é na realidade um arquivo cultural do que foi e continua a ser cultivado neste local. Apesar de estarem disponíveis nas redes sociais, Eva garante, “A nossa ideia nunca foi ser meramente uma coisa de redes sociais ou com o objetivo de criar um grande impacto fora da aldeia, a nossa prioridade sempre foi ver se as pessoas estavam recetivas ao projeto e depois no fim fazer publicações”. No entanto, assumem que colocou a população emigrante mais próxima à aldeia e também trouxe novas pessoas a conhecer a Torre, no decorrer dos últimos meses.

 “A ideia é materializar isto em intervenções na rua e tudo mais, mas uma das coisas que estamos a tentar fazer é sentarmo-nos com as pessoas mais velhas que conhecem as lendas. Temos já algumas entrevistas feitas com pessoas daqui.”, refere Diogo.

Devido à situação atual, explicam que tem sido difícil conversar com os habitantes locais mas as ideias continuam a surgir. Planeiam fazer um mapa, em forma de intervenção, com as criações artísticas espalhadas pela aldeia, onde as pessoas irão conseguir localizar cada mural. Para além do foco principal do momento ser a tradição e costumes, afirmam que no futuro poderão estar abertos a outro tipo de propostas, a acontecer na própria aldeia.

A aldeia da Torre teima em não ficar adormecida numa sociedade que se desgruda cada vez mais das suas raízes. É um exemplo de sentido de comunidade e irmandade ao mais alto nível, que orgulha as gentes da terra.

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Fotos: Aldeia Pintada