Keep Razors Sharp: “Overcome é a nossa superação enquanto indivíduos e banda!”


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Os Keep Razors Sharp são relativamente recentes como banda mas desde a sua projeção e sucesso são bastante notórios. Com membros de The Poppers, Sean Riley & The Slowriders e dos, já desfeitos, Capitão Fantasma, quisemos perceber melhor este fenómeno da música nacional e estivemos à conversa com Luís Raimundo, vocalista dos Keep Razors Sharp.

 

Gostava de começar pelo início. Como é que surgem os Keep Razors Sharp? Já se conheciam há muito tempo ou não?

Sim, basicamente coincidiu com a vinda do Afonso Rodrigues e do Bráulio para Lisboa. Na altura nós costumavamos sair à noite e passavamos muito tempo juntos e o Bráulio sugeriu que formassemos uma banda, isto porque tínhamos a sala de ensaio dos Poppers, que é a minha outra banda, que podíamos usar. Todos tocavamos um instrumento e já tínhamos algum historial ligado à música. Pensámos: “Porque não fazer algo nosso?” e assim foi. Foi muito descomprometido. No primeiro ensaio ficou praticamente tudo definido.

Isso era outra pergunta. Vocês não são todos de Lisboa. Como é que se conhecem e se juntam?

Não somos todos de Lisboa, não. O Afonso viveu muito tempo em Leiria, o Bráulio viveu grande parte da vida dele em Coimbra, o Bibi é de Lisboa e eu também. Foi uma feliz coincidência encontrarmo-nos todos em Lisboa. O Afonso também passou por Coimbra onde fundou o Sean Riley & the SlowRiders e também foi onde conheceu o Bráulio. Por essa altura eles vêm para Lisboa e é aí que nos conhecemos.

E porquê Keep Razors Sharp? De onde vem essa designação?

Quando o Afonso ainda não estava em Lisboa nós trocavamos e-mails e eu despedia-me sempre com “keep razors sharp”. Na minha cabeça aquilo significava, mantém-te atento, mantém-te forte. Tempos depois, quando fundámos a banda, o Afonso lembrou-se da expressão e sugeriu que fosse o nome da banda. Mais uma coisa que surgiu naturalmente.

E vocês conseguem viver todos da música? Tocar ao vivo, gravar, editar ou também têm trabalhos diários?

Depende. Eu  tenho outra ocupação, está ligada às artes também mas é um emprego diário. Eu tenho o meu trabalho durante a semana, o que acaba por dar algum conforto. Relativamente aos outros membros, vai depender de cada um deles. Eu tenho esse ritmo diário! Ainda ontem à noite estive a ensaiar com Razors depois de sair do meu trabalho e hoje estou cá novamente (no trabalho). É essa a dinâmica da minha vida.

Ainda há pouco falaste da forma descontraída de como criaram a banda e já há quem vos considere das melhores bandas nacionais. Equacionavam que isso seria possível ou simplesmente foram com a maré?

Foi sempre de uma forma muito relaxada. Se fores a ver o nosso primeiro single nem videoclip tem. Tem o nome da banda a branco num fundo preto. Nós podíamos não nos ter dado bem na sala de ensaios ou em palco mas tivemos a felicidade de que as coisas casaram todas – fizeram sentido e cada vez mais fazem. Estarmos juntos e fazermos música juntos é uma coisa que nós gostamos de fazer naturalmente. Somos muito próximos e acabamos por viver a vida uns dos outros. Num processo em que começámos por fazer música simplesmente por acaso, começámos a perceber que havia um ambiente ideal. Existia um potencial dentro de nós para podermos criar, fazer coisas novas. Fazer o rock que nós gostamos, espelhado nos dois discos. Falo por mim, Razors já é um projeto tão importante como eu tenho Poppers. O mesmo para os outros membros porque vejo-os com a mesma sede de fazer e criar.  Quando começas a perceber que há ali matéria para criar alguma coisa que pode ser significativa para ti pessoalmente, a ideia é naturalmente continuar a fazer discos e a tocar.

Sobre a vossa criação, quem é que são as vossas influências? Não só por terem as vossas bandas mas nota-se que têm gostos bastante abrangentes…

Sim. O Afonso é uma pessoa mais eclética, com um conhecimento musical muito grande. É um digger, vai à procura de coisas novas. Depois tens o Bráulio que é uma pessoa ligada mais ao punk. No meu caso, sempre fui muito apaixonado pelos 70’s e algum hip-hop. Já o Bibi tem um historial mais ligado à cena pesada, como o metal, apesar de ouvir um pouco de tudo. Isto tudo junto acaba por dar Razors! Cada um de nós tem influências muito distintas. E lá está, isto podia funcionar como podia não funcionar…

Com todas essas bússolas influenciadoras, quais são os artistas ou bandas mais consensuais? 

No início existiam algumas bandas que andávamos a ouvir simultaneamente, por exemplo Jesus and Mary Chain. Naturalmente Razors acabou por ser uma misturada de tudo o que ouvimos, incluindo rock clássico e assim. Eu, pelo menos, fui aí buscar alguma influência. Depois de conhecerem os nossos projetos, acho que se nota perfeitamente as nossas várias influências e a identidade da banda pois em cada canção nota-se a influência de cada um. Acaba por ser interessante que a identidade de cada um não se sobrepões às restantes. Há um respeito muito grande entre a minha guitarra e a do Afonso, entre o baixo do Bráulio e a bateria do Bibi, a voz do Afonso com a minha voz, agora contamos também com o Chico que é o teclista e também esteve envolvido na gravação do disco. Há de facto uma linguagem e uma forma de comunicar muito própria.

Há pouco falavas do primeiro single. Eu pergunto sobre o primeiro álbum. Como é que ele surge? Já havia alguma base de riffs, letras ou alguma coisa escrita?

Não. Nós temos uma forma de criar que foi definida logo no início. Havia a tendência de eu ou o Afonso, enquanto compositores de canções, de levar alguma coisa para o estúdio mas ficou logo assente que não entrava nada. Seria apenas aquelas quatro pessoas numa sala de ensaios. Tudo o que ouves, tanto no primeiro disco como no segundo, são feitos com essa forma de trabalhar. Com a ideia “Ok, hoje vamos para dentro do estúdio e fazemos canções, vamos para lá curtir”. E há coisas que saem e outras que vemos que não é a nossa cena naquele momento. Mas tem tudo a ver com as ideias daquelas quatro pessoas naquela altura, naquele momento. É dessa forma que as canções aparecem.  Às vezes começas com um riff de guitarra meu, outras vezes com um ritmo de bateria do Bibi, outras vezes com uma linha de baixo do Bráulio, outras com um riff do Afonso, mas é tudo ali, naquele momento, com aquelas quatro pessoas.

Isso lembra-me de outra questão. Ao produzir não se sentem às vezes a patinar? Que estão num limbo criativo e que não avançam?

Não. Isto até pode parecer um bocado arrogante mas é a verdade é que não temos dificuldade. Há dias em que chegas ao estúdio e não aproveitas nada, depois há outros em que ficas com três canções ou com três bases para trabalhar. Mas fazendo uma retrospetiva sobre os ensaios, as coisas têm corrido muito bem. O que acontece é que nós nos damos ao luxo de poder escolher o caminho que queremos. A dada altura temos várias canções e começamos a escolher aquelas que nos interessam mais para o caminho do disco.

Falando ainda do primeiro álbum. Como é que foi o feedback? Foi algo gradual ou já havia uma noção que os Keep Razors Sharp existiam e que estavam a trabalhar?

Nós começamos a produzir com o intuito de lançar um álbum. Fomos tocar ao Super Bock Super Rock, o nosso primeiro single começa a passar na rádio e a verdade é que tanto no primeiro disco como no segundo, fomos muito acarinhados não só pelo público como também pelos media. Tanto o primeiro como o segundo disco tem airplay na rádio, as críticas têm sido maravilhosas. É muito bom sentires-te abraçado por aquilo que fazes. Eu não faço música para ter reconhecimento mas é bom sentires esses elogios, o interesse das pessoas, o interesse dos media, leres bons textos que espelham o teu trabalho e quem disser que não liga a isso está a mentir. Até agora tem sido uma viagem incrível, com altos e baixos, naturalmente, como qualquer boa história.

Vocês são considerados uma super banda, visto que todos vocês têm projetos com sucesso anteriores, já são todos reconhecidos na música…

Eu não concordo muito com isso. Acho que o conceito de uma super banda aplica-se mais quando tens aqueles grandes guitarristas que se juntam. Isso talvez seja uma super banda. Quando tens The Band com o Ringo Starr, o Ronnie Wood e o Van Morrison, isso sim é uma super banda. Eu compreendo a posição, somos quatro músicos que vimos de bandas com alguma relevância e juntamo-nos para fazer música. Eu compreendo esse rótulo mas não nos identificamos.

Esse era a primeira parte da pergunta, se se identificavam com o termo. A segunda parte era: não achas que muito do sucesso que têm tido não se deve ao facto de as pessoas já vos conhecerem?

É uma pergunta interessante, nunca me a tinham feito. A verdade é que muita gente quando nos ouviu na rádio ou no YouTube não sabia que éramos o Rai dos Poppers ou o Sean Riley. E sentimos que houve uma ligação, um click, mesmo não sabendo que éramos nós. Por outro lado, em termos de comunicação e conteúdos, naturalmente que ajuda porque as pessoas que compram os meus discos vão querer saber o que é que eu estou a fazer, tal como as pessoas que compram os discos do Afonso vão querer saber o que é que ele anda a fazer. Mas isto tem sempre os dois pólos! O pólo em que as pessoas são apanhadas desprevenidas e nem sabiam quem éramos e depois tens aquelas pessoas que chegam um bocadinho mais tarde e pensam “Ah, mas estas pessoas estão a fazer isto, deixa lá ouvir”.

Falando um bocadinho nos rótulos, tal como o rótulo da super banda. O vosso estilo é um pouco de post-rock, shoegaze. Nesses rótulos vocês já se identificam ou não? 

Sinceramente eu olho para Razors e vejo uma banda de rock n’ roll. Temos várias influências. Neste segundo disco temos várias abordagens do que é o rock. Temos shoegaze, temos rockpost-rock. Eu não consigo categorizar a banda mas por outro lado também te digo que é muito difícil alguém catalogar o seu trabalho.

Queria agora falar aqui um pouco da vossa dualidade entre as bandas. Sentem que conseguem produzir para os Keep Razors Sharp e também para as vossas bandas? Por exemplo, estares a ensaiar com Poppers e pensares “Não, isto ficava melhor em Razors” e vice-versa?

Não, isso não acontece. Quando combinámos em fazer as canções de Razors seria sempre com os quatro em conjunto.  Uma coisa é a influência que eu tenho em Poppers, que é grande. Outra coisa é eu fazer parte de uma banda como Razors onde eu tenho 25% da quota criativa e por aí consigo distanciar-me mais. Por norma, quando estou em casa, estou muitas vezes a pensar em música e agora que acabámos o disco de Razors e andamos aí com o disco, o disco de Poppers já está muito bem delineado. Acho que cada um tem o seu ritmo e para mim funciona assim: quanto mais tempo eu estiver parado, pior é. Consigo diferenciar e esse processo criativo de Razors facilita-me muito as coisas. Toda a gente em Razors tem o mesmo peso na criação, óbvio que depois vêm as letras e eu e o Afonso metemos as letras por cima daquela base feita por aquelas quatro pessoas. E acredito que com o Afonso seja a mesma coisa porque a forma dele criar também é essa.

E quanto à agenda? Conseguem conciliar os concertos de todas as bandas envolvidas? Ou já aconteceu terem de cancelar ou reagendar concertos?

Isto tem de estar muito organizado. Eu falo por mim: tenho duas bandas, um emprego diário. Só tenho tempo de ensaiar à noite mas com muito trabalho, muita dedicação e muito amor por aquilo que faço, isto acontece de uma forma pouco acidentada mas é preciso alguma organização, naturalmente. Quando tens um concerto fechado em certa data, tens que avisar a agência para que não sejam marcadas mais datas ali perto. Até agora tem corrido bem! Também já aconteceu eu no mesmo festival ir tocar com duas bandas na mesma noite, mas é uma coisa que se faz bem, não é nenhum problema. Carece sim de alguma dedicação e vontade porque passas muito tempo fora de casa. ,as eu não me posso queixar minimamente porque estou a fazer aquilo que amo.

E tocar ao vivo, qual é que foi o concerto mais marcante e porquê?

Eu acho que já tivemos vários concertos muito marcantes. Os concertos que me saltam à vista foram, naturalmente o primeiro num palco grande, no Super Bock Super Rock, foi um concerto que demos no Bons Sons e outro que demos no Indie MusicFest. Quem é músico compreende o que eu estou a dizer. Desde o primeiro acorde, do primeiro momento que há ali uma zona de conforto, parece que está tudo certo e existe uma comunhão entre público e banda. Eu, enquanto músico procuro muito essa sinergia entre público e eu.

Voltando ao estúdio, queria falar um bocadinho do Overcome. Começo pelo nome, porque é que se chama Overcome? É alguma superação, é alguma vontade de se superarem?

Foi sugerido pelo Afonso numa sessão de gravação. Basicamente é o espelhar destes últimos anos em que cada um de nós superou as suas dificuldades e tivemos que ter uma força muito grande para ultrapassar algumas coisas menos boas que foram sucedendo. Esta superação batiza o disco de uma forma perfeita. É a superação enquanto indivíduos e banda!

E neste segundo álbum a fórmula manteve-se sobre não levarem nada preparado ou já levaram?

Não. Nós fomos para a sala de ensaios para fazer este disco e despejámos as nossas frustrações nas canções. Podes chegar a um dia em que estás mais chateado com a vida e vais fazer uma música mais agressiva, outros dias mais melancólicos. O Overcome é um bocado assim. Eu acho que a música deve ser isso, um espelho de quem a faz. Num dia estás mais chateado e só te apetecer é ligar um fuzz e rebentar com tudo, noutros dias não. Acaba por ser um espelho daquilo que somos.

E o feedback em relação a este segundo álbum? O que têm sentido?

Está a ser incrível! Estamos no final do ano, aquela fase dos melhores disco do ano e estamos a ser muito acarinhados. Houve logo uma ligação com o primeiro vídeo Always and Forever. Não nos podemos queixar, tanto em Portugal como fora. Vamos ter oportunidade de estar no Eurosonic com este segundo disco, acabámos de assinar contrato com a Live Nation, que é uma das maiores agências e promotoras da Europa. A vida está-nos a correr muito bem…

Sobre o futuro, que perspetivas é que têm? Mais discos, mais fãs?

Eu vejo o meu futuro com eles a criar canções e fazer discos. Tenho que gerir bem as minhas expectativas porque já ando aqui há algum tempo. Só me vem à cabeça que eu quero fazer discos com pessoas que respeito muito. A nossa música e aquilo que fazemos vai ser um espelho do que somos e se as pessoas se ligarem como se têm ligado ao que fazemos, muito bem. Se não, nós vamos continuar, enquanto exista vontade para fazermos música. Simplesmente temos feito aquilo que nos apetece e isso preenche-nos.

Para finalizar, onde é que podemos ver os Keep Razors Sharp num futuro próximo? Já há festivais?

Nós vamos fazer uma mini tour na Bélgica e na Holanda em Janeiro, vamos estar no Eurosonic, vamos estar este sábado (22 dezembro) em Leiria, e temos mais datas confirmadas. Quanto aos festivais naturalmente que já começam a haver algumas conversas. Para já não posso partilhar, mas brevemente terão mais novidades.

 

 

Foto: Joana Linda